Morre no Rio Abdias Nascimento, ativista do movimento negro
Ele faleceu aos 97 anos na noite de segunda-feira (23).
Ativista estava internado há dois meses.
O ativista do movimento negro Abdias Nascimento morreu na noite de segunda-feira (23). A informação foi confirmada pelo Centro de Articulação de Populações Marginalizadas (Ceap) na tarde desta terça-feira (24).
Segundo Ivanir Santos, do conselho estratégico do Ceap, Abdias, de 97 anos, estava internado no Hospital dos Servidores, no Centro do Rio, há dois meses e sofria de diabetes.
De acordo com nota enviada pelo hospital, ele teve uma insuficiênica cardíaca na unidade. Ainda segundo o hospital, ele estava internado por complicações cardíacas desde o dia 15 de abril.
Ativista desde a década de 1930, Abdias fundou o Teatro Experimental do Negro (TEN) em 1944 e criou o Instituto de Pesquisas e Estudos Afro Brasileiros (Ipeafro) em 1981 para continuar sua luta pelos direitos do povo negro, sobretudo nas áreas da educação e da cultura.
Abdias também foi Deputado Federal, Senador e Secretário de Defesa e Promoção das Populações Afro-Brasileiras do Estado do Rio de Janeiro, de 1991 a 1994.
O velório e enterro do ativista ainda não têm local nem data definidos.
http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2011/05/morre-no-rio-abdias-nascimento-ativista-do-movimento-negro.html
Memória: uma trajetória de lutas e conquistas
Ao espelho te vejo negrinho
Te reconheço garoto negro
Vivemos a mesma infância
A melancolia partilhada do teu profundo olhar
Era a senha e a contra senha
Identificando nosso destino
Confraria dos humilhados
A povoar de terna lembrança
Esta minha evocação de Franca
Biografia
As raízes africanas mergulham em terra brasileira, e brota no interior de São Paulo e Minas a vida do menino Abdias. Nascido em Franca, capital dos calçados, conheceu descalço a vida rural e urbana daquele tempo ainda perto da escravatura. Trabalhava na cidade e brincava nas fazendas onde sua mãe prestava serviços, às vezes como ama-de-leite. Desse tempo ficam as lembranças e os anseios de liberdade expressos no vôo de pássaros e borboletas.
Como adulto, os múltiplos talentos e formas de expressão de Abdias Nascimento voltam-se todos para o avanço da causa anti-racista.
Na dramaturgia, poesia e pintura, no engajamento na luta internacional pan-africanista e na atuação como deputado federal, senador e secretário de estado, desenvolve aspectos dessa luta, a que dedicou plenamente uma vida de 90 anos.
Nasce em Franca, SP, em 1914, o segundo filho de Dona Josina, a doceira da cidade, e Seu Bem-Bem, músico e sapateiro. Abdias cresce numa família coesa, carinhosa e organizada, porém pobre, e vai se diplomar em contabilidade pelo Atheneu Francano em 1929.
Com 15 anos, alista-se no exército e vai morar na capital São Paulo. Na década dos 1930, engaja-se na Frente Negra Brasileira e luta contra a segregação racial em estabelecimentos comerciais da cidade. Prossegue na luta contra o racismo organizando o Congresso Afro-Campineiro em 1938. Funda em 1944 o Teatro Experimental do Negro, entidade que patrocina a Convenção Nacional do Negro em 1945-46.
A Convenção propõe à Assembléia Nacional Constituinte de 1946 a inclusão de políticas públicas para a população afro-descendente e um dispositivo constitucional definindo a discriminação racial como crime de lesa-pátria.
À frente do TEN, Abdias organiza o 1º Congresso do Negro Brasileiro em 1950.
Militante do antigo PTB, após o golpe de 1964 participa desde o exílio na formação do PDT. Já no Brasil, lidera em 1981 a criação da Secretaria do Movimento Negro do PDT.
Na qualidade de primeiro deputado federal afro-brasileiro a dedicar seu mandato à luta contra o racismo (1983-87), apresenta projetos de lei definindo o racismo como crime e criando mecanismos de ação compensatória para construir a verdadeira igualdade para os negros na sociedade brasileira. Como senador da República (1991, 1996-99), continua essa linha de atuação.
O Governador Leonel Brizola o nomeia Secretário de Defesa e Promoção das Populações Afro-Brasileiras do Estado do Rio de Janeiro (1991-94). Mais tarde, é nomeado primeiro titular da Secretaria Estadual de Cidadania e Direitos Humanos (1999-2000).
O LEGADO
"A ausência de liberdade e de garantias para um trabalho desse tipo, derivado do reforço repressivo de fins de 1968, me conduziram aos Estados Unidos desde aquela data, e com isto o Teatro Experimental do Negro, como também o Museu de Arte Negra, como instituições visíveis, deixaram de existir. Porém, visto de outra forma, as atividades do TEN e do MAN tiveram prosseguimento noutro contexto, na luta mais ampla do pan-africanismo".
- Abdias Nascimento, O quilombismo, 2ª ed. (Brasília/Rio: Fundação Cultural Palmares/ OR Editor, 2002), pág. 150.
ATUAÇÃO INTERNACIONAL.
Em 1968, Abdias viaja aos Estados Unidos com apoio da Fundação Fairfield, para encontrar-se com lideranças do movimento social afro-norteamericano. No roteiro dessa viagem, visita a Spirit House, do poeta Amiri Baraka (LeRoi Jones) em Newark. Viaja também a Oakland, Califórnia, onde é recebido por Bobby Seale na sede dos Panteras Negras. Visita várias instituições no Harlem, em Nova Iorque, inclusive o Negro Theater Ensemble. (mais: http://www.abdias.com.br/exilio/exilio.htm)
ABDIAS NASCIMENTO E O PAN-AFRICANISMO
O primeiro grito internacional de Abdias do Nascimento
A incômoda voz de Abdias do Nascimento irrompeu pela primeira vez no âmbito internacional quando ele enviou sua "carta-declaração-manifesto" ao 1º Festival Mundial das Artes e das Culturas Negras, realizado em Dacar, Senegal, em 1966 [reproduzida neste volume como Apêndice de Sitiado em Lagos]. (mais: http://www.abdias.com.br/exilio/exilio.htm)
PRONUNCIAMENTO DE ABERTURA
2ª Plenária Nacional de Entidades Negras Rumo à 3ª Conferência Mundial contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Formas Correlatas de Intolerância, Rio de Janeiro, 11 de maio de 2001
Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
"Acusamos o Brasil do crime de racismo, de genocídio contra os povos indígenas e afrodescendentes".
Laroiê!
Minhas irmãs e meus irmãos; colegas e companheiros militantes do movimento negro de todo o país, saúdo vocês na pessoa dos integrantes da Comissão Organizadora do Fórum Nacional de Entidades Negras, aqui representada pelo poeta Éle Semog.
Às mulheres negras organizadas, Geledés, Criola, Casa Dandara, Coletivo N'Zinga, Fala Preta!, enfim, a todas as entidades de mulheres negras que atuam pelo país afora, um axé especial. Viva o exemplo de Luísa Mahin!
Aos povos indígenas, nossa saudação fraterna. Todas as deliberações do movimento negro os incluem em solidariedade, guardadas as características específicas de sua luta.
Nossas saudações cordiais aos ilustres convidados representantes dos organismos oficiais, Sr. Walter Franco, representante da ONU; Embaixador Gilberto Saboya, Secretário Nacional de Direitos Humanos do Governo Federal; e a Srª. Benedita da Silva, Vice-Governadora do Estado do Rio de Janeiro.
Agradecendo à magnífica reitora da UERJ, Nilcéia Freire, que mantém a tradição deste espaço sempre aberto à participação comunitária, gostaria - com a sua permissão - de saudar o corpo docente e discente e os funcionários da UERJ na pessoa do nosso companheiro João Costa Batista.
Finalmente, as mais calorosas saudações para os nossos convidados do exterior, Moshe More da Coalizão de ONG's Sul-Africanas: Amandla!
E Romero Rodrigues, do Mundo Afro Uruguai - Axé, meu irmão!
(mais: http://www.abdias.com.br/exilio/exilio.htm)
ATUAÇÃO PARLAMENTAR
Nas primeiras eleições após o regime de exceção, Abdias assume a cadeira de deputado federal, primeiro afro-brasileiro a defender no Congresso Nacional os direitos humanos e civis de sua gente.
Apresenta o primeiro projeto de lei propondo políticas públicas de igualdade racial, que chama de ação compensatória. Retoma a proposta da Convenção Nacional do Negro de 1946 e submete à apreciação o projeto de lei que define o racismo como crime de lesa-humanidade.
Atua de forma intensa pelo fim das relações do Brasil com o regime racista de apartheid na África do Sul e pela independência da Namíbia.
Participa da criação da Comissão do Centenário da Abolição da Escravatura, no Ministério da Cultura, e contribui para a transformação desta comissão em um órgão permanente do referido Ministério, a Fundação Cultural Palmares.
No Senado, reapresenta seu projeto de lei sobre ação compensatória e sugere criar uma ação civil pública contra atos de discriminação racial. Participa das primeiras reuniões de um bloco parlamentar negro em formação.
ATUAÇÃO COMO SENADOR
Em 1990, Abdias é eleito na chapa do PDT ao Senado pelo Rio, com Darcy Ribeiro e Doutel de Andrade. Em 1991, assume a cadeira no Senado e pouco depois é nomeado primeiro titular da Secretaria Extraordinária de Defesa e Promoção das Populações Afro-Brasileiras (SEAFRO) do Governo do Estado do Rio de Janeiro, criada pelo Governador Leonel Brizola. Em 1996, falece o senador Darcy Ribeiro e Abdias assume a cadeira de novo, exercendo o mandato de senador até 1999.
Abdias reapresenta no Senado seu projeto de lei sobre ação compensatória (PL 75/1997). Com duas propostas, procura estabelecer o princípio da reparação para o povo afrodescendente. A primeira cria uma ação civil pública contra atos e omissões de discriminação racial (PL 114/1997). A segunda estabelece sanções na contratação de serviços para o setor público contra empresas que cometem atos e omissões de discriminação racial (PL 73/1997).
Apresenta, ainda, emenda à Constituição Federal garantindo às comunidades remanescentes dos quilombos os mesmos direitos fundiários assegurados às populações indígenas (PEC 38/1997). Sugere a inscrição dos líderes da Conjuração Baiana, os mártires da Revolta dos Alfaiates, no Livro de Heróis da Pátria no Panteão da Liberdade e da Democracia, Praça dos Três Poderes, Brasília (PL 234/1997). Institui o Prêmio Cruz e Sousa, comemorativo do centenário da morte do poeta simbolista catarinense, preside os trabalhos do respectivo Concurso de Monografias (PR 126/1997), e publica livro com os respectivos documentos e textos.
Participa das primeiras articulações de uma frente parlamentar afro-brasileira.
PROJETOS DE LEI
1 - PROJETO DE LEI Nº 3.196 DE 1984
(Do Sr. Abdias do Nascimento)
2 - PROJETO DE RESOLUÇÃO Nº 58-A, DE 1983
Cria a Comissão do Negro; tendo parecer da Comissão de Constituição e Justiça, emitido em audiência, pela inconstitucionalidade.
(Projeto de Resolução nº 58, de 1983, a que se refere o parecer.)
3 - Indicação nº 17, de 1985
Sugere a manifestação da Comissão de Relações Exteriores sobre oportunidade da realização no Brasil de um Seminário Regional do Conselho das Nações Unidas para Namíbia ou de uma reunião do referido Conselho em nosso País.
Nos termos regimentais, solicito que a Comissão de Relações Exteriores se manifeste sobre a conveniência e a oportunidade do Governo brasileiro hospedar, em 1986, um seminário Regional promovido pelo Conselho das Nações Unidas para Namíbia, ou uma reunião do referido Conselho em nosso País.
4 - PROJETO DE RESOLUÇÃO Nº 1.550, DE 1983
Declara feriado nacional o dia 20 de novembro, aniversário da morte de Zumbi, e Dia Nacional da Consciência Negra, já celebrado pela comunidade afro-brasileira.
5 - Projeto de Lei nº 5.466, de 1985
Institui o "Dia Nacional da Empregada Doméstica", a ser comemorado anualmente a 27 de abril.
6 - PROJETO DE LEI Nº 3.765 DE 1984
(Do Sr. Abdias Nascimento)
Declara de utilidade pública a sociedade ILE ASIPÁ, sediada em Salvador - Bahia.
7 - PROJETO DE RESOLUÇÃO Nº 1.361, DE 1983
Manda erigir Memorial ao Escravo Desconhecido, na Praça dos Três Poderes, em Brasília, Distrito Federal.
8 - PROJETO DE LEI Nº 1.661, DE 1983
Dispõe sobre o crime de lesa-humanidade: discriminar pessoas, individual ou coletivamente, em razão de cor, raça ou etnia.
9 - Indicação nº 15, de 1985
Sugere a manifestação da Comissão de Relações Exteriores sobre oportunidade do rompimento, pelo Brasil, de relações diplomáticas com a África do Sul.
10 - PROJETO DE LEI N.º 1.332, DE 1983
Mais: http://www.abdias.com.br/atuacao_parlamentar/atuacao_parlamentar.htm
PRÊMIOS E HONRARIAS
- Ordem do Rio Branco, no grau de Oficial, outubro de 2001.
- Prêmio UNESCO, categoria Direitos Humanos e Cultura de Paz, outubro de 2001.
- Prêmio Comemorativo das Nações Unidas por Serviços Relevantes em Direitos Humanos, Rio de Janeiro, novembro de 2003.
- Homenagem da Presidência da República aos 90 anos "do maior expoente brasileiro na luta intransigente pelos direitos dos negros no combate à discriminação, ao preconceito e ao racismo". Brasília, 21 de março de 2004.
- Prêmio de Reconhecimento 10 Years of Freedom - South Africa 1994-2004, do Governo da África do Sul, abril de 2004.
MAIS: http://www.abdias.com.br/biografia/biografia.htm
http://www.abdias.com.br/biografia/biografia.htm
Este texto é uma montagem com informações que podem ser conferidas nos sites indicados no corpo do texto.
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